quarta-feira, 28 de outubro de 2009

Conservação de Flona sob ataque da Justiça e do Congresso

Na mesma semana, a Floresta Nacional (Flona) do Jamanxim, no Pará, recebeu dois golpes: um projeto que prevê a extinção da Flona passou na Comissão de Agricultura da Câmara dos Deputados e, caso seja aceito pela Comissão do Meio Ambiente sem nenhuma emenda, será aprovado. Outra ação negativa para a conservação da área foi o parecer favorável da Justiça a sete posseiros que criavam gado ilegalmente e foram pegos pela operação Boi Pirata, do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama).
A Operação Boi Pirata, que está na segunda fase e já interditou 35 mil hectares de terras ilegais, havia embargado a propriedade de sete ocupantes da Flona Jamanxim, que entraram na Justiça contra a ação e conseguiram liminar. As decisões assinadas pelos juízes federais José Airton Portela e Francisco Garcês Castro Júnior, de Santarém, permitem que os sete ocupantes continuem criando gado dentro da Flona.
Portela justificou a liminar argumentando que a Operação Boi Pirata violou "o princípio de livre iniciativa". Já Castro Júnior argumentou que a operação foi "desprovida de necessária intermediação judiciária".
O procurador da República no Pará Cláudio Henrique Cavalcante Dias contestou os argumentos. Segundo Dias, o princípio de livre iniciativa não pode suprimir outros valores constitucionais. "A ordem econômica deve respeitar alguns princípios, e entre eles o meio ambiente. Não é somente o fato de se ser assegurado a livre iniciativa que outros valores constitucionais devem ser desconsiderados".
Dias também questionou a alegação de que a operação precisaria de intermediação da Justiça. "A administração pública é dotada de autotutela. Ela pode atuar sem precisar da intermediação do poder judiciário. E isso qualquer estudante de direito sabe".
Boi Pirata e desmatamento
A Terra do Meio é uma das regiões em que se detectam os maiores índices de desmatamento e a Flona Jamanxim figura entre as Unidades de Conservação (UC) que mais sofrem com o desmate. Apenas no ano de 2009, de acordo com o Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), a Flona perdeu 60 km² de florestas. Foram detectados desmatamentos em quase todos os meses do ano, com pico em junho, quando a Jamanxim foi a UC que mais desmatou (18,8 km²).
Apesar da situação crítica, ela ainda está melhor do que estava antes da Operação Boi Pirata. Um estudo realizado pelos pesquisadores Paulo Barreto e Marília Mesquita, também do Imazon, mostrou que a operação Boi Pirata em 2008 ajudou a reduzir em 84% o desmatamento na região da Terra do Meio, no Pará.
A dificuldade em punir os responsáveis pelo desmatamento ilegal - como é o caso com os posseiros da Flona Jamanxim - pode pôr a perder as conquistas da operação. "Decisões desse tipo do Poder Judiciário prejudicam muito o meio ambiente. Porque se não existe punição pelos atos ilegais, não há nada que impeça essas pessoas de continuar praticando os ilícitos ambientais", explica o procurador.
Segundo Dias, o Ministério Público Federal está recorrendo, junto com o Ibama, da decisão. "Apoiar a operação Boi Pirata é fundamental, principalmente neste momento em que se está discutindo a revisão dessa Flona".
Revisão de limites
A revisão que o procurador relata se refere a algumas propostas que tramitam no Congresso Nacional com o objetivo de descontinuar ou até abolir a Flona do Jamanxim. Na semana passada, a Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural da Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Decreto Legislativo 1.148. Esse projeto pede que seja suspenso o decreto que criou a Flona Jamanxim.
O Projeto de Lei é de autoria do deputado Zequinha Marinho (PMDB-PA), que argumenta que a criação da Flona não teve participação da população. Segundo o deputado, a floresta foi criada com o único objetivo de dar uma resposta à opinião pública internacional pelo assassinato da missionária norte-americana Dorothy Stang.
"Ao amparo do que seria uma causa nobre, o governo federal, agindo de forma errônea e desastrada, imobilizou economicamente uma das mais ricas regiões brasileiras. Sem ter conhecimento pleno da área e sem realizar detalhados estudos prévios, criou uma série de áreas de preservação ambiental", diz o projeto.
O projeto, que recebeu parecer favorável do relator, deputado Zonta (PP-SC), foi aprovado na Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural da Câmara, e segue agora para a Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável.
Além desse projeto, os ocupantes da região também apresentaram uma proposta, mas para reduzir os limites da Flona. Eles pedem que 60% da área atual da floresta - 857 mil hectares - deixem de fazer parte da Flona, e outros 221 mil hectares sejam transformados em Área de Proteção Ambiental (APA). Por essa proposta, somente 225 mil hectares continuariam sendo Floresta Nacional. Esses habitantes querem que só seja Flona a área que tem florestas, e que as áreas em que ocorreu desmatamento sejam anistiadas.
Sobre essa revisão, o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) produziu um relatório analisando a situação, e concluiu que não se devem fazer revisão desses limites. Segundo o relatório, "concluiu-se que a Flona Jamanxim não deve ser alvo de desconstituição ou mesmo de drástica redução. Isto levaria a um recuo de estratégia governamental de conservação que traria consequências ambientais imprevisíveis não só para a própria área da Flona, mas também para várias outras unidades de conservação da Amazônia, invariavelmente sofrendo de pressão fundiária, invasões e interesses políticos".

Fonte: Amazônia.org

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