Nem todo sertanejo é um forte
Artigo do advogado ambientalista Ismael Moraes
Há 10 anos defendi os interesses do comerciante Francisco
Chapadinha em um caso cível no Tribunal de Justiça do Pará. Os adversários no
processo, além de assistidos por um talentoso advogado, faziam parte de uma
poderosa família tradicional de Santarém, cujos tentáculos influíam no Poder
Judiciário desde o fórum local até a alta cúpula, tornando difícil o êxito. Ele
sabia disso, mas a sua determinação em lutar era contagiante.
Na tribuna, aos desembargadores narrei o percurso difícil de
retirante nordestino que, sem inflexão de caráter, dignificou a riqueza que
amealhara com o trabalho diuturno e honesto. Citei Euclides da Cunha para
atribuir ao meu constituinte a mesma fibra inspiradora da máxima “Todo
sertanejo é um forte!”, de utilização clássica quando se quer realçar a
resistência não só física como moral dos homens daquela região árida.
Fazendo parte da Câmara Cível do Tribunal, o desembargador
Geraldo Lima, nordestino de nascimento e sempre afeto aos oprimidos, foi ao
delírio e chamou para si a causa. Divergiu do voto adverso da relatora, e, com
o voto vencedor, nos deu a vitória naquele caso que, até aquele dia,
considerava-se perdido para o perseverante arigó.
Eis que Chapadinha resolveu candidatar-se a deputado
federal, elegendo-se contra tudo e todos, contando apenas com a irresistível
simpatia de sua simplicidade e, claro, com os recursos financeiros de
empresário bem sucedido. Até hoje não sei se a sua plataforma política é o
desenvolvimento da região com melhorias fiscais aos comerciantes, se é a
aplicação de recursos para a instalação de projetos econômicos ou se ficara
apenas no discurso assistencialista que vi na campanha eleitoral de televisão.
O certo é que Chapadinha detém um mandato popular sem estar
obrigado a rezar na cartilha de qualquer grupo político ou econômico porque foi
eleito no corpo a corpo, por mérito e, claro, dinheiro próprios…
Mas tão certo quanto isso conferia independência e respeito
absoluto ao deputado federal Chapadinha, contra quem ninguém poderia acusar de
uso de dinheiro público para qualquer fim, a divulgação recente de que
negociara seu voto no processo de impeachment levou-o à vala comum dos
políticos profissionais, e permitirá, no futuro, mesmo que de forma injusta,
imputar-lhe a aquisição de patrimônio, manter-se no poder ou qualquer outra
forma de improbidade com o uso de recursos públicos.
E isso ainda pode ainda piorar com o agravamento da situação
econômica e social no caso de a presidente Dilma não ser cassada, porque todos
em Santarém ficaram sabendo que a Superintendência do INCRA foi entregue ao
deputado federal Chapadinha para votar nesse sentido.
Além de Chapadinha não possuir intimidade com o setor
fundiário, seja como empresário, sindicalista ou agricultor (“o que ele fará
com esse belo cavalo de Tróia?”), agrava o fato de que o INCRA, a par de ser
uma das mais conturbadas autarquias federais em qualquer lugar, em Santarém se
notabilizou por levar à cadeia todos os recentes superintendentes, acumulando
um passivo administrativo difícil de debelar a médio, quiçá a longo prazo.
Ao aceitar esse “mimo”, que mais parece uma armadilha,
Chapadinha foi seduzido pelas veleidades do poder. Deixou-se levar por uma
tentação à toa, infelizmente demonstrando que “Nem todo sertanejo é um forte”…
twitter @ismaeladvogado
Fonte: Rg 15\O Impacto
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